O trânsito IP não é apenas um termo técnico, é a espinha dorsal que mantém a rede global a funcionar. Pense no trânsito IP como as auto-estradas de alta velocidade da Internet, onde os dados atravessam continentes, ligando empresas, governos e indivíduos num piscar de olhos.
Porque é que o trânsito IP é tão importante? A resposta é simples. No nosso mundo interligado, a eficiência e a fiabilidade da transferência de dados são fundamentais. O IP Transit assegura que os pacotes de dados sigam as rotas mais eficientes através da complexa teia de redes globais.
1. A estrutura da Internet.
É importante conhecer a estrutura da Internet para compreender o trânsito IP. Esta estrutura mostra o sistema hierárquico da rede e o roteamento dos dados.
A Internet é uma rede de redes, constituída por sistemas autónomos (ASes) geridos por ISPs e ligados por pontos de troca de tráfego (IXPs). Ela utiliza uma variedade de métodos de ligação, incluindo fibra ótica, DSL, micro-ondas e satélite, para fornecer conetividade global. Isto torna possível o intercâmbio de dados e o acesso à Internet sem descontinuidades, independentemente do dispositivo ou da região.
A imagem seguinte ilustra a infraestrutura da Internet:
- Sistemas Autónomos (ASes) formam a espinha dorsal da Internet;
- Pontos de Troca de Tráfego (IXPs) onde os ASes trocam tráfego;
- Provedores de serviços Internet (ISPs) oferecem diferentes formas de acesso aos utilizadores finais;
- Tecnologias de acesso à Internet, incluindo redes Wi-Fi, celulares e de satélite.
O serviço de trânsito IP é criado quando um ISP permite que outras redes (como outros ISPs, empresas ou diferentes ASes) transmitam dados através da sua rede. Este serviço é essencial para os pequenos ISPs ou para as redes que não dispõem de infraestruturas que lhes permitam aceder a todas as partes da Internet por si próprias.
2. Acordos e tecnologias de rede.
A funcionalidade e o vasto alcance da Internet são mantidos através de uma complexa teia de relações e ligações entre diferentes redes de fornecedores de serviços Internet, empresas, nuvens, redes de distribuição de conteúdos, etc. Para compreender estas relações, vejamos mais de perto como são estabelecidas. Há duas formas de o fazer: peering e trânsito.
a. Serviço de peering:
O peering é um acordo de redes entre ISPs, para troca direta de tráfego. Este intercâmbio é geralmente gratuito. O peering reduz a latência e a dependência de redes de terceiros. Existem dois tipos principais de peering: público e privado. O peering público tem lugar nos pontos de troca de tráfego na Internet (IXPs), onde muitas redes se encontram. O peering privado é uma ligação direta entre duas redes.
b. Serviço de trânsito :
O trânsito é um serviço através do qual uma rede dá a outra rede acesso a toda a Internet. Ao contrário do peering, o trânsito é uma relação cliente-fornecedor. As pequenas redes pagam aos fornecedores pelo trânsito para poderem aceder ao resto da Internet. O trânsito é vital para os pequenos ISPs.
c. Acesso Dedicado à Internet (DIA):
O DIA é uma conexão de internet de alta velocidade, que é dedicada ao seu negócio e não é compartilhada com outras empresas. Acesso dedicado à internet é entregue via Ethernet ou linha privada, com a finalidade de fornecer conectividade de internet altamente segura e confiável para empresas gerenciarem as suas operações.
d. Como é que funcionam em conjunto?
O diagrama seguinte mostra como as diferentes partes da Internet se ligam utilizando o trânsito e o peering. Ilustra a forma como os pedidos de acesso à Internet (de indivíduos ou empresas) são encaminhados através de diferentes redes.
- Fornecedor de serviços de trânsito: A nuvem no centro representa uma grande empresa de serviços de rede que movimenta o tráfego da Internet ao longo de grandes distâncias. É um operador de autoestrada que permite que muitos condutores diferentes (dados) utilizem as suas estradas.
- Provedores de serviços de Internet: As nuvens designadas por “ISP 1”, “ISP 2” e “ISP 3” representam as empresas que permitem a todos aceder à Internet. São como as estradas locais que ligam as casas e as empresas às auto-estradas mais largas.
- Ligações: As ligações de trânsito mostram como os ISP se ligam a um fornecedor de trânsito maior para enviar e receber dados. As ligações de peering mostram como os ISP se interligam entre si. Para além disso, as ligações dedicadas de Internet são o caminho final seguido pelos dados para chegarem ao seu destino.
- Hierarquia: Os fornecedores de trânsito também podem ser ISPs. Os ISPs de nível 1 (Tier 1) dispõem de grandes redes para acesso global e competem exclusivamente entre si. Os ISP de nível 2 (Tier 2) e de nível 3 (Tier 3) têm escalas mais pequenas. Podem comprar ou alugar acesso à Internet a ISP de nível 1 de maior dimensão e ligar-se à Internet mais alargada (trânsito IP).
3. Encaminhamento em trânsito (AS e BGP).
O encaminhamento é essencial para a navegação de dados através da complexa rede de redes da Internet. No peering, as redes trocam informações de encaminhamento para enviar e receber dados diretamente. Em trânsito, um fornecedor oferece um acesso mais alargado, encaminhando os dados dos clientes através de toda a Internet. Estes processos de encaminhamento orientam os pacotes de dados ao longo de caminhos óptimos para os seus destinos, moldando a conetividade e a funcionalidade da Internet.
No domínio do encaminhamento, há dois conceitos importantes a considerar e que surgem frequentemente: AS e BGP:
- AS (Autonomous System): Um AS é um conjunto de rotas de Internet ligadas sob o controlo de um ou mais operadores de rede (ou ISPs). A cada AS é atribuído um número único, designado por ASN, que permite a sua identificação na Internet global. Este sistema permite às grandes redes gerir eficazmente as suas rotas e políticas, garantindo assim a fluidez do tráfego na Internet.
- BGP (Border Gateway Protocol): O BGP é o cartógrafo da Internet, decidindo sobre as melhores rotas para que os dados fluam de forma eficiente e segura. O protocolo BGP pode ser eBGP (BGP exterior) ou iBGP (BGP interior). O eBGP é utilizado para o encaminhamento entre diferentes ASes na Internet, enquanto o iBGP é utilizado para o encaminhamento dentro de um único AS.
- Como é que os AS comunicam usando o BGP?
O diagrama seguinte ilustra como diferentes Sistemas Autónomos (ASes) comunicam usando o protocolo BGP. Mostra-nos como redes de Internet separadas usam o BGP para enviar dados entre si e dentro de si da forma mais eficiente possível.
- Sistemas Autónomos (AS): Cada círculo representa uma rede ou AS, identificado com um número como por exemplo “AS 101”.
- Routers BGP: Dentro de cada AS, existe um router. Os routers utilizam o protocolo BGP para comunicar, o que garante que os dados sigam a melhor rota.
- eBGP e iBGP: O eBGP liga routers localizados em diferentes ASes. O iBGP, por outro lado, liga routers dentro do mesmo AS.
b. Trânsito IP via roteamento BGP + segurança (com RPKI)
Agora que já conhece as noções básicas de AS e BGP, vamos introduzir o conceito de trânsito. Também vamos adicionar segurança à mistura, com RPKI (Resource Public Key Infrastructure) adicionando uma camada extra de segurança ao roteamento BGP. Este protocolo de segurança garante que os dados sigam os caminhos corretos, evitando erros de encaminhamento e potenciais ataques maliciosos.
O diagrama seguinte ilustra a interação entre as redes empresariais e os fornecedores de serviços Internet, a fim de gerir de forma eficiente e segura o fluxo de dados, utilizando o BGP para o encaminhamento e o RPKI para a segurança das rotas.
- Redes empresariais (AS102 e AS103): Aqui, os dois círculos AS102 e AS103 representam duas redes empresariais separadas, cada uma com o seu próprio AS. Cada AS tem um router eBGP que determina o melhor caminho para enviar o seu tráfego Internet. Ambas as empresas necessitam de um serviço de trânsito para a Internet.
- ISP (AS101): Esta é a rede de um fornecedor de serviços Internet (ISP) que liga as empresas à Internet em geral. O ISP utiliza um router eBGP para gerir o tráfego de entrada e saída da Internet. Este ISP é o fornecedor de trânsito IP.
- Validação RPKI: Todas as redes têm validação RPKI para garantir que os caminhos dos dados são seguros e autorizados. É como um ponto de controlo de segurança que impede o tráfego de seguir na direção errada. O “RIR RPKI Repository Cache” é a autoridade centralizada que emite os passes de segurança para estes pontos de controlo.
- Outros ISP e empresas: Estas nuvens representam muitas redes que fazem parte da Internet, todas ligadas à nuvem central da Internet.
Cenário da Internet em África
Com aproximadamente 480 milhões de usuários, a penetração da Internet em África é de 28%, significativamente inferior à média global de 60%, e pouco mais de um em cada dez lares está conectado à rede.
Apesar desse atraso, o número de usuários conectados no continente cresceu sete vezes a média mundial entre 2000 e 2012, de acordo com o Internet World Statistics . “África atingiu uma penetração que quebrou a barreira dos 15% e isso é importante”, diz Nii Quaynor, conhecido como o “pai da internet” em África.
A maioria dos países subsaarianos produz muito poucos profissionais e não há estratégias de investimento em tecnologia. Os países se concentram no uso e consumo de tecnologia, mas não na produção, que é o que constrói a economia.
O desenvolvimento da Internet em África percorreu um longo caminho desde meados da década de 90 e, especialmente, na década de 2000, graças a mudanças nas políticas e regulamentos. Essas são mudanças que foram alcançadas graças aos esforços de líderes como Nii Quaynor.
“O principal desafio foi preparar o ambiente. As políticas, os negócios, a economia, tudo era novo”, diz Quaynor. A lentidão dos governos africanos em aprovar leis para promover o desenvolvimento e o uso de infraestrutura de TIC tem sido uma das maiores dificuldades.
A segunda onda da revolução digital começou com a conexão com o mundo por meio de cabos submarinos.
Até 2002, a única maneira de se conectar da África Subsaariana ao mundo era por meio de conexões via satélite, muito caras e com pouca capacidade. As novas conexões submarinas significaram um aumento notável na capacidade de transmissão de dados e reduziram drasticamente o tempo e os custos de transmissão.
Os cabos submarinos permitiram que os países compartilhassem informações tanto dentro do continente como com o resto do mundo de forma mais direta, criando mais espaço para inovação, pesquisa e educação.
Angola Cables possui a sua própria rede de cabos submarinos (WACS, SACS e MONET), alcançando mais de 33.000 quilômetros e estende seus serviços para mais de 50.000 quilômetros por meio de cabos parceiros, conectando as Américas, África, Europa e Ásia.
Mais de 70% do tráfego de Internet em África passa por um ponto da rede da Angola Cables, sendo a mesma responsável por 1% do tráfego Mundial de Internet.
A recente classificação da Angola Cables foi como o 21º maior operador global de interconexões de Internet pelo Center for Applied Internet Data Analysis (CAIDA).
Com uma infra-estrutura robusta, que já processa mais de 18.488 Tbps, a Angola Cables oferece soluções de conectividade de alto desempenho, permite uma entrega eficiente de conteúdos globais a nível local, oferecendo baixa latência, elevada resiliência e segurança.
Embora a África seja cercada por cabos submarinos, os países do interior têm maiores dificuldades de conexão.
Está nas mãos dos governos e das comunidades econômicas regionais implementar políticas que permitam aos países do interior se beneficiar da conectividade internacional.
A conexão de África com o mundo está avançada e a conexão entre os países africanos está em andamento. Porém, há um último aspecto a ser abordado, talvez o mais difícil: a conexão interna de cada país.
Podemos concluir que a Internet está a gerar valor social e econômico em todo continente africano, com a finalidade de apoiar o empreendedorismo e promover a inovação.
Alguns países tiveram um progresso significativo e outros países podem aprender com esta experiência.
Reduzir as divisórias digitais requer ação em quatro áreas: maior acesso à infraestrutura da Internet, melhor capacidade de aquisição, serviços e conteúdo digital local mais relevantes e habilidades digitais mais amplas.
Por: Marinela Liomba, Gestora de Produtos, Angola Cables